Existe alguma conexão entre o princípio da informalidade e a criatividade no contexto da mediação judicial? A mediação judicial é um dos caminhos de resolução consensual de conflitos, dotada de um procedimento próprio e princípios norteadores capazes de garantir um ambiente propício ao diálogo. O princípio da informalidade é um desses princípios aptos a abrandar o ambiente da mediação judicial, eminentemente jurídico e convencional. Essa abertura para a utilização de métodos e técnicas que ultrapassem as tradicionais pode ser eficaz no desenvolvimento da criatividade, como passo essencial na resolução de problemas complexos. É o que vamos ver neste artigo.
Muito embora o respeito aos princípios seja algo inegociável numa sessão de mediação, o princípio da informalidade possibilita uma quebra de padrão, pois flexibiliza quanto a forma (e não quanto aos demais princípios) de condução da sessão, em oposição ao rigor jurisdicional (Almeida; Paiva, 2019). Desse modo, apesar da existência de etapas como base “não há uma forma única predeterminada de processo de mediação. Os mediadores procuram estabelecer possíveis caminhos” (Sales, 2010, p. 4). Essa construção torna-se possível pois “A informalidade permite relaxamento, descontração e tranquilidade” (Tartuce, 2021, p. 212).
A informalidade contempla as palavras-chave do processo criativo: flexibilidade, liberdade e espontaneidade. (Nunes, 2022). A criação de opções que gerem ganhos para as partes (Patton; Ury; Fisher, 2018), é um dos momentos mais importantes de uma sessão de mediação, pois significa que as partes conseguiram superar a espiral do conflito e estão buscando as soluções possíveis de acordo com suas necessidades e interesses. Nessa linha, a criatividade acontece quando o ser humano se sente livre, ativa o lado direito do cérebro, responsável pelo pensamento flexível ou elástico, e amplia a sua capacidade de percepção e criação (Mlodinow, 2018).
Quando isso acontece, os caminhos internos se abrem, e fica mais fácil estimular a imaginação, curiosidade e a inspiração direcionada para a solução de problemas (Gompertz, 2015). Afinal de contas, a criatividade nao acontece somente com algumas pessoas, todo indivíduo possui plena capacidade criativa (Zugman, 2018). Para analisar essas possíveis conexões existentes entre o princípio da informalidade e a criatividade foi realizado um formulário on-line com 32 (trinta e dois) mediadores judiciais que já atuaram ou estão atuantes do Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania – CEJUSC de Fortaleza/CE. O formulário perguntava: dentre os princípios que norteiam a mediação judicial, quais deles você acredita que mais contribui para o desenvolvimento da criatividade numa sessão de mediação?
De acordo com o resultado, os mediadores judiciais acreditam que o princípio que mais contribui para o desenvolvimento da criatividade é o da autonomia da vontade, em primeiro lugar, em seguida, o princípio da informalidade, voluntariedade, confidencialidade e imparcialidade, respectivamente.
Portanto, podemos refletir que, apesar do interesse compor o processo criativo e princípio da autonomia da vontade significar que as partes envolvidas no conflito estão ali por espontânea vontade e não serão coagidas a fazer algo que não desejam, numa sessão de mediação, isso diz respeito a atuação das partes e não do mediador. As partes estão vivendo o conflito, envolvidas emocionalmente, interessadas na causa e precisam de um terceiro imparcial que facilite a comunicação, que as faça refletir, que abra um campo criativo, por esse motivo a autonomia da vontade pode não ser suficiente na construção do caminho que vai gerar opções de resolução para aquela situação.
A informalidade está relacionada diretamente com a atuação do mediador, que vai exercer desde a recepção das partes até o final da mediação uma liderança criativa e vai utilizar todas as ferramentas possíveis para que as próprias partes encontrem as soluções. É papel do mediador cumprir rigorosamente as determinações legais quanto aos princípios e todo o panorama legal que rege a sessão, mas o caráter informal permite que ele só não seja rigoroso quanto a forma, a sequência das etapas, a utilização de técnicas apropriadas, porque, como o mediador não sabe exatamente o que vai encontrar naquela sessão, ele precisa estar munido com o seu repertório criativo e ter a liberdade de construir esse caminho de acordo com as necessidades das partes.
É dever do mediador criar um ambiente que estimule a criatividade dos envolvidos, já que o objetivo da mediação é que as partes, dotadas de autonomia e empoderamento, se vejam capazes de resolver aquela situação, sem precisar delegar para um terceiro (juiz), para isso elas precisam enxergar alternativas.
Por fim, conclui-se que há uma conexão do princípio da informalidade com a criatividade, mas é provável que essa interseção não seja conhecida e explorada em sua máxima potência por parte dos mediadores judiciais, que em sua maioria (dos que responderam à pesquisa) acredita que é o princípio da autonomia da vontade que mais contribui para o desenvolvimento da criatividade numa sessão de mediação, a informalidade ocupou o segundo lugar. O que pode significar que os mediadores estão transferindo uma atribuição que é deles, para as partes. Essa temática precisa ser difundida.
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